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Gêneros Jornalísticos
Os Judas da política brasileira
Por Sáthia Vitória
Dia 13 de abril de 2016. Dia do beijo. Esse dia já vem sendo comemorado no ambiente político brasileiro há semanas. Na verdade, desde o resultado das eleições de 2014, vários beijos já foram dados. Muitos de comemoração, de alegria. Mas a maioria deles foram - e ainda são - beijos à Judas.
A oposição ao governo do PT carrega consigo uma responsabilidade histórica gravíssima: a incitação ao ódio – não fundamentado em quaisquer provas concretas contra a presidenta Dilma Rousseff - que tem promovido de maneira maçante a polarização da população e que traz à tona o grave risco da ocorrência de um impeachment completamente infundado e que quer apenas manter a corrupção sistêmica do país, e não livrá-lo dela.
De maneira intransigente, rancorosa, inconformada e autoritária, a direita brasileira trabalha não contra a corrupção, como incansavelmente dizem, mas contra a legitimidade da democracia. A democracia brasileira é jovem e ainda muito frágil. Tanto a oposição, quanto os que nela acreditam, deveriam, ao menos, reconhecer o voto das urnas e tratar com respeito aquilo que foi uma conquista soberana da população, mas esquecem do passado histórico – nem tão distante assim - do país e agem de maneira retrógrada, indo às ruas com cartazes e dizeres inconsequentes na tentativa de trazer de volta ao Brasil o pesadelo da ditadura militar.
A reeleição da presidenta Dilma Rousseff foi completamente deslegitimada pelo PSBD – juntamente com o apoio da mídia, é claro - com diversas teses altamente preconceituosas de que os eleitores da petista são burros, desinformados e ignorantes. O ódio paira pelo ar. O conservadorismo mostra a sua cara e promove, desde a vitória petista, um verdadeiro terrorismo econômico, social e político. Até o vice presidente Michel Temer, desconhecido, até pouco tempo atrás, tem protagonizado cenas um tanto quanto engraçadas – e potencialmente vergonhosas – dentro do cenário político. Temer, bom concorrente ao troféu de melhor Judas dessa história toda, primeiro publicou uma “carta desabafo” à presidenta. Depois, um áudio em que ensaiava seu discurso vitorioso no processo de Impeachment “vazou por acidente” – um acidente, digamos, bastante curioso, já que o áudio “vazado” teve seus segundos excepcionalmente bem calculados para entrar no Jornal Nacional e, de quebra, ainda ser tratado de maneira um tanto quanto respeitosa pelos nada sarcásticos apresentadores da bancada do JN.
São muitos beijos de Judas que enganam o povo. O da mídia é o primeiro: ela atua de maneira cada vez mais parcial e seletiva, formando opiniões e não dando espaço para que o telespectador possa formar as suas. Traição ao bom jornalismo. Traição ao povo. Combater a corrupção: quem se importa? Trata-se de um jogo pelo poder e de manobras que visam livrar da cadeia quem merece estar preso. Mais da metade dos deputados que compõem a Comissão de Impeachment, por exemplo, responde na justiça por processos de corrupção. O pedido de impedimento é conduzido por ninguém menos que o Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por crime de corrupção e lavagem de dinheiro. E o pobre, claramente o mais afetado caso o processo se efetue, é manipulado por um discurso rebuscado que o confunde e acaba, sem saber, dando em sua própria face o seu beijo de Judas em forma de apoio, militância e voto.
Em suma, o que se se sabe é que o atual governo do PT é indefensável. Não cumpriu com grande parte das promessas que fez durante o processo eleitoral de 2014. Mas não se pode apoiar um impeachment sem a prova de que a presidência cometeu um crime de responsabilidade. Não se pode burlar a Constituição do jeito que a direita tanto quer. Nem se pode apoiar um processo cujo fim seria o traidor e vice Michel Temer na presidência da república ou, no pior dos casos, o próprio réu do STF Eduardo Cunha. Seria um beijo de Judas muito bem dado na democracia. E seria o último beijo.