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O esquecido

Por Giovana Maria

Quinta-feira, 6h15 da manhã, Marcos acordou. Estava 15 minutos atrasado, 15 minutos esses que lhe custariam o café da manhã mais tarde. Vestiu-se apressado, pegou a maleta, a gravata e a garrafa d’água. Passou pela mesa já posta na noite anterior e, com o olhar cerrado, admirou o pão com manteiga que não seria saboreado por ele.  Abriu a porta e, ao pegar a chave para trancá-la, uma surpresa: não havia chave. Ficara em cima da mesa, ao lado do saco de pão. Que tortura! Custaria-lhe mais cinco minutos para achá-la.

Ao chegar ao elevador, apertou com fervor o botão. Achava que ele chegaria logo com a pressão impulsionada no pequenino botãozinho. Mais 2 minutos para o bendito chegar. Entrou e foi logo apertando o botãozinho da garagem. De relance, viu Dona Maria, a senhora que mora ao lado, carregando duas sacolas cheias, mas o tempo corrido não lhe permitiria ajudá-la. Assim que ela saiu, a torcida para chegar logo na garagem era imensa. Em seguida, foi em disparada ao seu carro e, por sorte, a chave estava junto à de casa. “Se não estivessem no mesmo molho, teria esquecido também’’, pensou ele.

Depois de quase bater a porta do carro, acelerou rumo à saída e por pouco não derrubou o portão.

– Seu João só pode estar dormindo, não é possível! – cochichou ele, estressado ao esperar o porteiro abrir o portão. Ao faltar cinco centímetros para o mesmo se abrir por inteiro, Marcos acelerou e entrou na rua sem sequer olhar para os lados.

Em disparada para a Avenida Soteiro, a qual precisa passar todos os dias para chegar ao trabalho, fez esse percurso de sete minutos em três. Contudo, a Avenida estava engarrafada, o que lhe custaria no mínimo mais 30 minutos. Nesse tempo pegou a gravata e vestiu. Estava tão nervoso que repetiu o nó cinco vezes até conseguir deixá-lo da forma correta. Estava com fome, bebeu três goles da água na esperança de saciá-la. O tic tac do relógio o assombrava. Marcos nunca gostou de chegar atrasado no emprego. Ligou o som e esperou o tempo passar.

Depois de toda a correria, conseguiu chegar ao estacionamento da empresa faltando 5 minutos para o expediente começar. Procurou por uma vaga e, ao suspirar um “graças a Deus’’, encontrou-a rapidamente. Chamou o elevador e, ao entrar na sala, olhou o relógio. Eram 7 horas em ponto. Ele conseguiu.

O dia caminhou até rápido, haviam vários documentos para assinar e Marcos ficou tão envolvido que nem viu o tempo passar. Depois do almoço, ele precisou editar alguns arquivos que estavam no pen drive. Abriu a maleta, tateou por todos os cantos e não achou. Esqueceu o pen drive na cabeceira da cama, não lembrou de pegá-lo ao acordar. Tudo bem, havia salvado todos os arquivos no email. Procurou, procurou e procurou e nada! Esquecera, mais uma vez, de salvar os arquivos por precaução.

Estava com dor de cabeça. “Pelo menos isso eu tenho’’, pensou ele acreditando ser verdade. Olhou na gaveta da sua mesa, olhou na maleta, procurou até pelos bolsos da calça. Não havia remédio algum. A última cartela havia acabado há duas semanas e, como de costume, esqueceu de comprar uma nova.

– Marcos Antônio! – gritou o chefe.

            – Oi, chefe. – respondeu Marcos, receoso.

            – Termine este relatório para mim e depois está liberado – disse o chefe.

            – Tudo bem, pode deixar. – afirmou Marcos. 

Cansado, mas dedicado, Marcos terminou o relatório, deixou na mesa do chefe, se despediu dos colegas e foi para casa. Ao entrar, parou na portaria para pegar as contas.

       – Boa noite, Seu João. Tem conta minha aí?

       – Boa noite! Tem sim Seu Marcos. – disse ele, entregando as contas.

Marcos pegou, entrou, estacionou, apanhou suas coisas no carro e chamou o elevador. Ficou alguns minutos esperando. Deveria estar vindo do último andar. Após chegar, apertou o número 6 e subiu. Na porta do seu apartamento achou uma caixa no chão, em formato arredondado. Pegou-a e entrou em casa. Curioso, abriu. Tinha um bolo e, ao lado, um cartão. Era da Dona Maria.

Sorriu com o gesto de carinho da senhora atenciosa que tem como vizinha. Era mesmo uma ótima pessoa. Em seguida abriu o cartão e começou a ler: ‘’Hoje cedo fui ao mercado comprar os materiais para fazer um bolo. Imaginei que você não estivesse comendo direito esses últimos dias porque quase não para em casa. Espero que goste. Você só se esqueceu de uma coisa hoje, do BOM DIA.’’

     Chateado, Marcos percebera que esqueceu, entre todas as coisas, a mais importante: desejar bom dia àqueles que o rodeiam.

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