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Diferentes

Por Isis Pereira

            Ela tinha chegado na tarde anterior. Tudo estava do mesmo jeito que há um mês atrás – sua casa, seu quarto, sua cama, tudo milimetricamente igual, até o decorrer do dia parecia um replay constante da vida que havia deixado para trás. Ali era seu lugar de refúgio, de descanso, para onde ela sempre corria: para o colo da mãe, para o carinho dos amigos que ficaram, para o marasmo, para a quietude. Deitada no sofá ela ouve uma buzina e, ao abrir a porta, se depara com ele.  Bonito como sempre, a mesma voz de homem maduro que tantas vezes a acalmou e a fez sorrir, os mesmos olhos castanhos que tantas vezes a desejou. Mas, naquele momento, ele parecia cansado e distante. Haviam motivos para a distância e ela sabia enumerar todos eles, afinal, foi ela que, após planos e sonhos adiados, decidiu deixá-lo, embora às vezes pense que isso foi a maior loucura da sua vida.

            A conversa transcorreu com as amenidades já esperadas: como ele estava, como andava a vida, os negócios, falas comuns entre dois velhos conhecidos. Em dado momento, ela pergunta:

_ E o coração, como está?

_ Está aqui, tentando se recuperar – ele responde a olhando com tristeza.

Ela respira fundo, lembrando que tinha passado os últimos dias se preparando psicologicamente para saber que ele já estava com outra, pensando que a dor que é esperada se torna menos intensa.

_ Que bom que você está bem – ela diz.

_ Estou levando a vida da forma que dá. Depois que terminamos fiquei sem rumo. Acho que me perdi de mim mesmo, sei lá.

_ Sinto muito. Torço para que fique bem. Até achei que você já estava com alguém.

Uma risada ecoa dos lábios dele.

_ Falar como a música de Jorge e Mateus: estou virado já tem uns três dias, quase não estou ficando em casa e estou sozinho, quer dizer, estou com todas e nenhuma ao mesmo tempo.

Ela se espanta ao ouvir isso. Aquele não era o perfil dele: beber, sair com muitas meninas. Ele era todo sério, responsável, caseiro. Aonde estava o cara perfeito que ela namorou por anos, o homem comportado com o qual ela planejou casar? Sem pensar, ela solta:

_ Estou decepcionada, você não se parece nada com o homem que eu conheci.

Outra risada parte dele.

_ Você tem razão. Estou muito diferente daquele homem que você conheceu, nem sei se ele existe mais. Como disse, estou meio perdido.

Algumas lágrimas escorrem pelo rosto dela. Sim, ele tinha razão. Ele não era mais o cara que ela amou e ela não era mais a garota com quem ele pensou um dia se casar. Nada era como antes. Talvez a dor e frustração pelo término era a mesma para ambos, mas, enquanto ele tinha mudado e se considerava perdido, ela também se via diferente, porém, aos poucos estava se encontrando.

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