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Uma linda mulher

Por Larissa Carinhanha e Pedro Menezes

     Aconteceu numa manhã, aparentemente normal, de quarta-feira. Eu estava a caminho da universidade, atrasado, como de costume. Perdi um ônibus e, por alinhamento dos planetas, entrei no próximo em que haviam trabalhadores e estudantes que, assim como eu, estavam interessados em chegar logo aos seus destinos. Mas comigo foi diferente, naquele momento, exatamente às 09h15, eu vi algo que ninguém notou e, consequentemente, ninguém se importou.

      Era uma linda mulher, se mostrava independente, vestia uma roupa casual e, dando um ar de muita vaidade e bom gosto, usava um salto extremamente bonito. Sentada em uma das cadeiras do ônibus, ela conversava com outra mulher, seu sorriso irradiava os corredores do automóvel e, pelo que parecia, apenas eu e minha namorada, que estava ao meu lado, conseguimos notar o quão feliz aquela mulher se mostrava.

     Seguimos a viagem e, em certo ponto, a linda mulher teve que descer. Foi nesse momento que percebi uma fúria muito grande surgindo no rosto da minha namorada. Preocupado, segurei em seu braço e, enquanto questionava o que havia acontecido, uma situação deprimente se desenrolava naquele lugar no momento em que a mulher, linda, independente, vaidosa e de bom gosto, descia do veículo. Eram dois homens, um era o motorista e o outro era mais um passageiro, que se encontrava em pé, na porta de entrada. Eles eram, aparentemente, mais velhos do que eu e minha namorada juntos. Ambos observaram a mulher descendo as escadas e, ao passo que eu pensava no quão bonita ela era, estes indivíduos a analisavam com olhos maus e, quando ela se retirou e o ônibus voltou a andar, aqueles homens que, anteriormente eram pra mim pessoas normais, se tornaram verdadeiros monstros, de índole questionável.

     “Namora com o cobrador, não percebeu?”, disse o motorista. O cobrador, que usava um óculos espelhado de muito mau gosto e se situava logo atrás do banco em que eu e minha namorada estávamos, respondeu com tom de chacota: “Comigo mesmo não...”.            Neste mesmo momento minha namorada o encarou com muita raiva, uma raiva que era perceptível em toda a sua feição. O homem, percebendo a fúria dela,  disse: “Nada contra, mas né?!”. Pronto, foi nesse ponto em que nós dois nos encontramos num ambiente preconceituoso que, infelizmente, tínhamos que estar todos os dias.

      Minha namorada e eu nos questionamos a todo momento, após o acontecido, se pessoas, como eu e aquela linda mulher, com o livre arbítrio de ser quem somos, não podem frequentar lugares públicos sem serem alvos de preconceito, chacota e de todas as outras situações humilhantes que os opressores colocam diante de nós oprimidos.

     Eu, como um homem trans, senti no corpo inteiro a transfobia sofrida por aquela mulher. Senti a dor que nós, transexuais, transgêneros e travestis, somos submetidos todos os dias apenas pelo ato de sairmos de casa. É uma luta diária, é preciso muita coragem, até para subir num ônibus.

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